Informamos os nossos Leitores de que:
Em cumprimento do Despacho n.º 12564-A/2021, de 23 de Dezembro, nos próximos dias 24 e 31 de Dezembro a Biblioteca da Ajuda estará encerrada.
Agradecemos a melhor compreensão.
A Biblioteca da Ajuda é uma das mais antigas Bibliotecas de Portugal caracterizando-se, pela natureza e riqueza dos seus fundos, como uma Biblioteca Patrimonial que tem por objecto a conservação, estudo e divulgação do seu acervo documental
Informamos os nossos Leitores de que:
Em cumprimento do Despacho n.º 12564-A/2021, de 23 de Dezembro, nos próximos dias 24 e 31 de Dezembro a Biblioteca da Ajuda estará encerrada.
Agradecemos a melhor compreensão.
Informamos os nossos leitores que, por motivos de actividade interna da DGPC, estaremos encerrados à leitura no dia 10 de Novembro (quarta-feira).
Desde já as nossas sinceras desculpas por qualquer transtorno causado.
A Coordenadora
A propósito dos 256 anos do nascimento de Manuel Maria Barbosa do Bocage (Setúbal 15 de Setembro de 1765- Lisboa 21 de Dezembro de 1805). Uma evocação no âmbito das Jornadas Europeias do Património a partir de alguns manuscritos e fragmentos avulsos da colecção da Biblioteca da Ajuda. Setembro de 2021
“Censura que João Guilherme Christiano Muller fez da parte do Desembargo do Paço ao 2º Tomo das Rimas de Manoel Maria Barbosa de Bucage”. BA 54-IV-34 (4)
[ms a lápis 1797-1799]
No manuscrito que V.ª Magde me mandou ver pela Portaria retro apresenta o seu prendado Author novas produções do seu raro talento, que lhe assegura hum lugar distincto entre os Vates insignes Lusitanos, aos quais ainda a Posteridade fará justiça. Poesias ternas que penetrão o coração e onde de vez em quando luzem vislumbres de esclarecida Filosofia, captivando a participação dos espíritos mais meditativos do que sentimentais. Fabulas graciosas que ensinão a prática das virtudes as mais benéficas e promovem a intuição de verdades nunca assas ponderadas Misturadas com traducçoens que patinteão tanta familariedade de seu Author com as belezas das Línguas dos Originaes, como também o seu acesso no sanctuario dos mais recônditos tesouros do seu idioma vernáculo; e com Epistolas, Odes e Epodos altissonantes nos quaes desenvolve toda a força de hum genio culto, e transcencendente, unido intimamente com huma fantasia inexaurivel poética: numa palavra tudo quanto pode servir de documento de hum gosto eminente para os mais admiráveis produtos de todos os tempos, e de todas as regioens do nosso Mundo de mão dada com a singular dexteridade de o transplantar sobre o pátrio chão em quanto neste se cultivão com igual diligencia, e feliz sucesso os seus próprios : de tudo isto he a presente collecção hum elegante florilégio. Bem pena he ser inevitável que se mostrasse em muitos lugares a influencia da atmosfera túrbida, carregada, e penosa, debaixo da qual o Author plantou grande parte deste rico jardim. Felizmente porem se percebe mais o efeito lamentável disto sobre a mente aflicta do poeta, que sobre as flores e fructos encantadores das vergônteas que regou com os effluvios do seu pranto, em cujo afago a sua Musa sempre conserva menos o caracter de Ministra de inhumanas, e indecorosas paixoens, do que de dictames da Razão e Moralidade e mimosa descripção, prompta a sacrificar tudo o que pode tentar a fraqueza humana a pecar contra respeitáveis Leis, boa ordem social, e tranquilidade civil, e domestica. Eisaqui as observaçoens que resultarão do exame deste manuscripto, e sobre as quaes se escora o meu parecer, que haverá poucos tam dignos da faculdade que o Sup.e solicita. V. Magde porem ordenara o que for servida.”Em 16 de Maio de 1792 o Príncipe Regente D. João nomeava como Deputado da “Real Meza da Comissão Geral sobre o Exame e Censura dos Livros” João Guilherme Christiano Muller[1], justificando o gesto com o facto de querer “fazer uteis os conhecidos talentos e distincta Litteratura (…) que o fazem merecedor de toda a honra e consideração” [BA (54-IV-34 (5)]. Muller exercerá o cargo durante 22 anos, justificando os pareceres que elaborou no desempenho daquela Comissão, as expectativas de quem lhe fizera “mercê” de tal distinção.
Retrato de Bocage (miniatura), José de Almeida Furtado, o Gata (1778-1831), têmpera sobre marfim, MNAA, inv. 56 Min.[2]
O Censor Ilustrado.
A “Censura que João Guilherme Christiano Muller fez da parte do Desembargo do Paço ao 2º Tomo das Rimas de Manoel Maria Barbosa de Bucage” [ms BA 54-IV-34 (4)] vem confirmar a ideia, inovadora, sobre ter sido a Real Mesa Censória, e a que lhe sucede Real Mesa da Comissão Geral sobre o Exame e Censura dos Livros[3], “um dos primeiros lugares onde se desenvolveu uma reflexão sistemática sobre as qualidades e defeitos estéticos das obras literárias”[4] pois, as “censuras” permitiam aos deputados, não só deliberar sobre a adequação dos escritos “aos padrões políticos, religiosos e morais do Reino”[5], impedindo a circulação dos que contivessem qualquer desvio em relação à norma, bem como, avaliar a forma como se expressavam os autores. Isto é, o facto da recusa da impressão poder ser justificada “com base em critérios estilísticos”, pelo modo defeituoso como os escritores se exprimiam na sua língua, sendo comum os censores discorrerem “longamente sobre a qualidade dos textos, do ponto de vista da pureza da linguagem, da construção de personagens, da elaboração das tramas, da observância aos preceitos poéticos e retóricos”[6], entre outros, demonstra um lado pouco divulgado do trabalho daqueles deputados.A “censura” tomava, assim, parte do projecto pedagógico na defesa da Ilustração contra o obscurantismo, do progresso contra a superstição, da separação do certo do errado, mas de igual modo, na defesa da clareza da exposição contra artifícios, condenando “metáforas e hipérboles sem alguma proporção; (de) frases affectadas e totalmente alheias do genio da nossa língua”[7], gongorismos, ou incorrecções que “tanto ofende[m], emaltrata[m] anossa Lingoa”[8], conforme se pode ler em alguns daqueles textos.
Aos “Reparos” que
Julião Cataldi, Secretário do Conselho Geral do Santo Ofício, fizera sobre o manuscrito
das Rimas, que incidiam tanto no que
respeitava “(d)o fogo lascivo e (d)as imagens
indecentes que animão estes versos”, tendo “o ultimo terceto, ou pelo menos” sendo “susceptivel de sentido impio, porque nelle o Poeta pertende justificar
a mesma paixão impura, a qual no quarteto antecedente havia chamado Igneo
desejo audaz (…)”, chamando a atenção para o verso “sem que importe ao rigor que eu viva ou morra”, arbitrando que “(…)
a liberdade poetica não pode chegar a
tanto que se declare assim contra o modo com que procede a Justiça nestes
Estados” [ BA 54-IV-34 (3a)]; argumentava
Bocage em sua defesa, condenando os seus carrascos, pois, escrevia:
“Quem por si ou por
outrem conhecer na desgraça o coração humano, saberá que o crime, e muito mais
o erro necessariamente se queixa do rigor, e o julga excessivo. Que menos pode
dizer um infeliz, abismado em huma das masmorras publicas desta cidade, onde a insensibilidade
dos guardas lhe desdenhava a existência como supérflua? O desafogo d´aquele
verso só a estes alude, e compete a quem não sendo um perverso, padeceu algumas
vezes, o que a eles se deve. Confesso, alem disso é uma perfeita ingenuidade,
que me não sinto capaz de substituir áquele verso outro, que exprima tão bem
uma situação lastimosa, e desamparada; preferindo antes a supressão de toda a
Epístola á de huma parte della, que me parece tão essencial”. Terminava “V. Magde porem mandara o que for servida”
BA 54-IV-34 (3).
Entre o parecer de Cataldi, condenador, e os argumentos de Bocage em defesa do poema enquanto reflexo da sua própria vivência, a decisão final cabia ao Príncipe Regente que manda João G. Christiano Muller, analisar as poesias. Este, inspirado pela novidade da escrita e pela força do que considera ser “um génio culto”, ou “um raro talento”, não gasta uma só linha da sua prosa a sentenciar o autor e, bem pelo contrário, cumula-o de elogios, pois considera “que haverá poucos tam dignos da faculdade que o Sup.e solicita”.
Iniciando o seu parecer, estabelece desde logo o lugar que
Bocage deveria ocupar no seio da literatura lusitana - “No manuscrito que V.ª Magde me mandou ver pela Portaria retro apresenta
o seu prendado Author novas produções do seu raro talento, que lhe assegura hum lugar distincto entre os Vates
insignes Lusitanos, aos quais ainda a Posteridade fará justiça”, para de seguida identificar os
tópicos de modernidade naqueles versos - “Poesias
ternas que penetrão o coração e onde de vez em quando luzem vislumbres de
esclarecida Filosofia, captivando a participação dos espíritos mais meditativos
do que sentimentais”. Considerando que “com
Epistolas, Odes e Epodos altissonantes nos quaes desenvolve toda a força de hum
genio culto, e transcencendente, unido intimamente com huma fantasia inexaurivel
poética” coloca-o num patamar de qualidade supranacional - “numa palavra tudo quanto pode servir de
documento de hum gosto eminente para os mais admiráveis produtos de todos os tempos,
e de todas as regioens do nosso Mundo de mão dada com a singular dexteridade de o
transplantar sobre o pátrio chão em quanto neste se cultivão com igual
diligencia, e feliz sucesso os seus próprios: de tudo isto he a presente
collecção hum elegante florilégio”.
A “ilustrada”
censura de Muller, apontando tanto
para a “esclarecida Filosofia”, como
para a força da expressão poética, culta e introspectiva, traduziu-se na autorização
para a impressão da obra, demonstrando como, no final do Antigo Regime, as
tensões ideológicas e sociais existentes encontravam no Regente uma resposta
que, conciliadora, não deixava de apontar as inovações estéticas, ideológicas e
culturais que despontavam, o que levou autores como Ana Cristina Araújo a
condenar a utilização da expressão de “Viradeira”,
para “significar o retrocesso decorrente
da política “repressiva” e “reacionária” de D. Maria I”, e Regência de D.
João, no campo da cultura[9],
tese que parece ir ao encontro da afirmação de Jorge Pedreira de que
apesar de durante a regência-reinado de D. João VI ter “havido restituição da censura dos livros, teria sido essa censura no
seu tempo tão suavemente exercida que nunca pessoa alguma deixara de ter com
facilidade quaisquer obras”[10].
Censura que se exercia de uma forma branda que não impedia a circulação de
obras “suprimidas”, ainda que na mão
de uma elite, sendo pois frequente a existência de livros “suprimidos” constarem nos inventários quer de particulares, quer de
Livrarias de Ordens Religiosas.
MMB
[1] Hans
Christian Muller, (Gottineng, 1752 – Lisboa 1814), intelectual de elevada
craveira que veio para Portugal em 1772 para exercer a sua actividade de pastor
protestante. Convertido ao catolicismo, foi nomeado deputado à Real Mesa
Censória, sendo ainda membro da Academia Real das Ciências.
[3] A Real Mesa da Comissão Geral para o Exame e a Censura dos Livros foi criada, por Decreto de D. Maria I, em 28 de junho de 1787 para substituir a Real Mesa Censória criada pelo Alvará de 5 de abril de 1768, no reinado de D. José I. Ver https://digitarq.arquivos.pt/details?id=4311313. Consulta em 21.09.21.
[4] ABREU, Márcia, Censura Lusitana : uma pré-história da crítica literária. Disponível em http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/estudos/ensaios/censura.pdf. Consulta em 20.09.21.
[5] ABREU, Márcia, No papel de leitor: a censura a romances nos séculos XVIII e XIX. Disponível em https://www.ufrgs.br/gthistoriaculturalrs/marcia_abreu.html.
[6] ABREU, Márcia, Censura Lusitana : uma pré-história da crítica literária. Disponível em http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/estudos/ensaios/censura.pdf. Consulta em 20.09.21.
[7] In TAVARES, Rui, O Censor Iluminado. Ensaio sobre o Pombalismo e a Revolução Cultural do Século XVIII, Ed. Tinta da China, 2018, p. 621.
[8] ABREU, Márcia, No papel de leitor: a censura a romances nos séculos XVIII e XIX. Disponível em https://www.ufrgs.br/gthistoriaculturalrs/marcia_abreu.html.
[9] ARAÚJO, Ana Cristina, A Cultura das Luzes em Portugal Temas e Problemas, Livros Horizonte, 2003, p.18. Disponível em https://eg.uc.pt/bitstream/10316/47433/1/A%20Cultura%20das%20Luzes%20em%20Portugal.pdf. Consulta em 21.09.21.
[10] Pedreira, Jorge; Costa, Fernando, D.João VI, o Clemente, Círculo de Leitores, 2006, pag. 21.
Sábado | 25 setembro |15h00 - 18h00 | Adultos | Visita - atelier presencial | Gratuito
Vamos desenhar a, e na, Biblioteca da Ajuda. Esta é uma iniciativa organizada no âmbito das Jornadas Europeias do Património 2021, pela Biblioteca da Ajuda e Serviço Educativo do Palácio Nacional da Ajuda, em parceria com Tomás Reis, arquiteto e membro dos Urban Sketchers
A Biblioteca da Ajuda, uma das mais antigas bibliotecas de Portugal. Entre livros e manuscritos tão diversos, vários sobreviveram ao terramoto. Outros acompanharam a Família Real ao Brasil. E hoje, muitos segredos continuam ali guardados. Mais do que ler, iremos escolher as histórias que as salas têm para contar, desenhando da monumental entrada à vista da janela.
É com muito gosto que informamos que algumas obras manuscritas da Biblioteca da Ajuda, enquadradas pelo tema geral Macau-China: fontes sécs. XVI- XIX, estão a ser disponibilizadas online pela Biblioteca Nacional Digital / BNP. Incluídas no projecto "Descrições de Macau-China dos Séculos XVI ao XIX", promovido pelo Observatório da China e que envolve várias instituições nacionais ligadas ao estudo e divulgação do papel histórico de Macau, o Portal Digital daqui resultante permite o acesso e consulta integral dos códices já digitalizados [aqui]
O tema da educação dos príncipes, presente em títulos célebres desde o séc. XVI ("Espelho de virtudes", "Espelho de um Príncipe cristão" ….), evoca imediatamente o "contraponto natural" da instrução associado aos tempos livres dessas tarefas pedagógicas e que se condensa num verbo: BRINCAR. Focando-nos na infância dos que vieram a ser os últimos habitantes permanentes do Paço da Ajuda – D. Luís e D. Afonso – e do seu irmão mais velho – D. Pedro V - que incarnou o modelo do Príncipe esclarecido, moderno, aberto às inovações mecânicas e organizacionais e atento ao evoluir da história num século de transformações críticas na política, economia e sistema social e deparamo-nos com uma falha de testemunhos circunstanciados das suas brincadeiras habituais. O "Diário" do mestre de Latinidades dos infantes, Francisco António Martins Bastos (BA 51-XII-44), instrumento fundamental para aceder à esfera privada e familiar do paço real, à época nas Necessidades, é bastante pormenorizado no espaço consagrado à instrução formal diária mas pouco detalhado na ocupação dos tempos livres que muitas vezes são remetidos para o tempo de férias em Mafra e Sintra ou para referências de actividades que se desenrolam após o tempo diário de estudos e que são apenas apontadas como tempos livres passados no exterior em passeios e actividades dinâmicas (caça, cavalgadas, procura e recolha de espécies naturais…) ou no interior em actividades lúdicas em família (música e canto, desenho, leitura..). Os paços da família real incluem também para uma área física onde se desenrolam estas actividades familiares e que ainda hoje é visível: a sala de jogos de Mafra, com os seus 'campos' de futebol de manejo e outros 'acessórios' desta ordem, muitos importados, ou as salas de Mármore e do Bilhar na Ajuda.
Um destes indícios materiais das actividades lúdicas dos príncipes é uma peça muito curiosa, integrada na colecção da BA onde tem a localização 35-XV-11, e que atesta um conjunto de afirmações sobre a educação dos infantes no séc. XIX: um jogo, semelhante ao da "Glória" e que tem por objectivo a aprendizagem e treino de matemática. "Aprender, brincando" é uma fórmula pedagógica da modernidade e que ao aplicar-se directamente a esta peça lúdico-pedagógica dá conta da novidade dos ideais educativos da Família Real no seu espaço íntimo. A atenção à educação e às suas consequências directas na reconstrução de uma nação e de um povo tornam-se marcas maiores do programa régio de D. Maria II – cujo epíteto de "A Educadora" abarca as dimensões pública e privada da sua actuação - e de D. Pedro V, exposto por dever e gosto aos princípios de uma educação simultaneamente de rígida instrução livresca e livre actuação na natureza, de severo equilíbrio entre o estudo sério e árido e as aplicações práticas e lúdicas desse mesmo estudo nas vertentes científicas. Tal como para aprender Ciências Naturais os infantes construíram um Museu de curiosidades vegetais e animais que recolheram previamente ou que lhes foram oferecidos para satisfazer este seu passatempo, o cálculo aritmético simples é o cerne de um jogo colectivo de tabuleiro em que imaginamos várias crianças brincando empenhadamente. Sinal de uma educação moderna em que o lazer, a brincadeira, os tempos livres são partes fundamentais de uma educação completa que compreende a instrução mas a ela não se limita, em que BRINCAR pode ser uma dimensão do APRENDER. E se hoje esta é uma afirmação corrente e inócua é ao final do séc. XVIII / início de XIX que a devemos com a mudança da imagem da infância e a valorização da liberdade, do corpo e do lazer.
A Biblioteca da Ajuda — Biblioteca Real, sua antiga designação— foi
herdeira de alguns acervos legados pelos seus possuidores.
De entre eles destacamos a livraria de José Monteiro da Rocha (1734-1819), mestre do príncipe D. Pedro e dos Infantes seus irmãos, doutor em Cânones, lente da Universidade de Coimbra onde regeu as disciplinas de Ciências Físico-Matemáticas e Astronomia, membro da Sociedade Real da Marinha e da Academia Real das Ciências (à qual legou a colecção de manuscritos). A sua livraria, com ca. de 1300 títulos, foi deixada em testamento ao príncipe real D. Pedro de Alcântara (futuro D. Pedro IV), e incorporada na Biblioteca da Ajuda em 1822 (BA. 52-XIV-35, nº 42).
Reg. 390 (2.º parte)
Mapa da Baía em gesso, colorido, sobre madeira; perdas no canto superior esquerdo
37,5 x 51,7 cm
Reg. 391 (3.º parte)
Mapa da Baía em gesso, colorido, sobre madeira;
37,5 x 51,7 cm
Ambos os mapas, não datados e sem autoria atribuída, têm na cartela, para além do título e da escala usada as iniciais A.D.S.A.
Reg. 390
Até à data as iniciais, acima, apesar das várias tentativas de identificação, nada nos diziam (!) há dias, no seguimento de uma troca de e-mails, com um dos mais importantes historiadores do Brasil, o Prof. João José Reis (Univ. Federal da Bahía) e graças ao seu contributo, ficámos a saber que as inicias se referiam a Anastácio de Santa Anna autor do "Guia de Caminhantes" [aqui], do acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Do mesmo modo a data, que estava situada no séc. XVII foi, com a informação prestada e por comparação, recolocada na segunda metade do séc. XVIII princípio do XIX.
Mais informações:
José Monteiro da Rocha (Canavezes, 25 de Junho 1834 – Lisboa, 11 de Dezembro 1819) / Fernando B. Figueiredo [aqui]
José Monteiro da Rocha (1734-1819): notícia do seu legado na Biblioteca da Ajuda [aqui]Escrevia, em 1965, Mariana Machado Santos, directora da Biblioteca da Ajuda (1954-1974), que há muito estava “em aberto uma dívida para com um dos maiores pensadores e trabalhadores da nossa Pátria que chefiou e orientou durante trinta e oito anos a “Real Biblioteca de Sua Magestade”[1]. Referia-se a Alexandre Herculano que, de 1 de Agosto de 1839 a 13 de setembro de 1877, desempenhara funções como “Bibliotecario-Mor de Sua Magestade El-Rei”, na Biblioteca anexa ao Paço Velho da Ajuda.
Este texto, a propósito do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, tem como base o levantamento sobre a obra de Alexandre Herculano na Biblioteca da Ajuda, bibliografia activa e passiva, efectuado pela Dr.ª Conceição Geada, ao longo da sua longa e profícua carreira na instituição.
Quisemos evocar Alexandre Herculano (1810-1877), não apenas pelo seu trabalho de organização e engrandecimento da Real Biblioteca, que foi imenso, mas, de igual modo, pelas suas reflexões sobre a sociedade portuguesa de oitocentos, enquanto polemista empenhado na regeneração pátria, nas quais se incluem as páginas que dedicou à salvaguarda dos Monumentos Pátrios, os “livros de pedra”, incluídas nos seus Opúsculos[2], e ainda de uma actualidade indelével.
Na
sua obra Alexandre Herculano e a
Biblioteca da Ajuda, Mariana M. Santos elencou alguns factos pelos quais o
historiador ficara ligado à história da instituição pois, apesar de não ter acompanhado
a mudança para as novas instalações, na ala norte do Palácio novo, em 1880,
onde actualmente se encontra, deixará, no entanto, uma marca perene na sua
organização.
O Livro
de Linhagens do Conde D. Pedro,
fragmento apenso ao Cancioneiro, será
publicado por Herculano na obra Portugaliae
Monumenta Historica[7].
Do Cancioneiro retirará, ainda, versos
de Pero da Ponte, (cantiga 292) que
incluirá em O Monge de Cister.
[Livro das Linhagens de D. Pedro, Conde de Barcelos]:
Integrada nas
Lendas e Narrativas, A Dama Pé de Cabra tem como fonte o [Livro
das Linhagens de D. Pedro, Conde de
Barcelos], cópia manuscrita do séc. XVI, proveniente da Biblioteca dos
Oratorianos das Necessidades, códice igualmente à guarda da BA[8].
Naquela, o narrador introduz-nos no ambiente temporal no qual decorre a lenda, alertando
o leitor que a razão pela qual a vai contar “é porque a li num livro muito
velho”[9],
invocando a sua relação com contextos literários medievo
Devem
ainda ser destacadas, dentro da imensa produção literária de Herculano, duas
obras marcantes no panorama da investigação historiográfica oitocentista:
Da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal[10], para a qual utilizou núcleos documentais insertos no acervo da BA.
Monumentos Patrios. Não menos relevantes foram os seus artigos acerca da questão da preservação dos monumentos arquitectónicos que deram origem a escritos incisivos, nos quais denunciou a incúria face à ruína e à degradação, às quais os vestígios venerandos da nossa história eram votados, numa sociedade deslumbrada com os desígnios do “progresso”.“Livros de pedra”, documentos eles também, que via desabar à sua volta, fruto da ganância especulativa, e que o levaram a escrever palavras fundacionais de uma consciência patrimonial em Portugal, e a proclamar, no artigo “Monumentos Patrios, de 1838”- “contra a índole destruidora dos homens de hoje que a razão e a consciência”, escrevia, o forçavam a ele “a erguer a voz e a chamar, como o antigo eremita, todos os ânimos capazes de nobre esforço para nova cruzada”, para a qual propunha se erguesse “um brado a favor dos monumentos da historia, da arte da gloria nacional, que todos os dias vemos desabar em ruinas”[14].
Quis Herculano que a História fosse “cousa mais séria e grave do que a narração exclusiva de dois casamentos, quatro enterros, e seis batalhas”[15], como escrevia na introdução do Portugaliae Monumenta Historica, e “fosse uma verdadeira sciencia que habilite o presente e o futuro para tirarem lições do passado”.Foi
esse o seu imperativo moral, a sua cruzada cívica, e de certo modo utópica, que
revelava a natureza poética e “romântica” do seu pensamento, na busca de
modelos e acontecimentos de um passado longínquo, que o levou a procurar “um
refúgio lustral”, sobretudo na Idade Média, “época a que atribuía sentimentos
vigorosos e de um sadio crescer social”[16],
confessando na Introdução de O Bobo: “No meio de uma nação decadente,
mas rica de tradições, o mister de recordar o passado é uma espécie de
magistratura moral, é uma espécie de sacerdócio”[17].
O
espírito de missão que norteou o trabalho de Alexandre Herculano fez com que
legasse, às gerações futuras, o fruto das longas horas que passou
“desenterrando diariamente do pó das bibliotecas e dos archivos monumentos
desconhecidos”[18].
A sua procura de um passado plural, múltiplo e rico de propostas, aberto generosamente ao futuro, complexo, diverso e informado e que nos permite rejeitar leituras anacrónicas, pobres e redutoras da História, é a lição magistral, que nos deveria obrigar à (re) leitura da obra de Alexandre Herculano.
MMB
(BA)
[1] SANTOS, Mariana A. Machado, Alexandre Herculano e a Biblioteca da Ajuda, Separata de O Instituto, Vol. CXXVII, Coimbra, 1965, p. 4. - Acessível em, https://digitalis-dsp.sib.uc.pt/institutocoimbra/UCBG-A-24-37a41_v127-1/UCBG-A-24-37a41_v127-1_item1/P138.html
[2] HERCULANO, Alexandre, Opusculos, Lisboa, 1897-1907, BA 119/120- B-82 a 92. Acessível em, https://purl.pt/718/4/;
[3] Pato, Bulhão, Memórias. - Lisboa : Typ. da Academia Real das Sciencias, 1894-1907. - 3 vol. ;Acessível em, https://archive.org/details/memorias01bulhuoft/page/190/mode/2up?view=theater
[4] COSTA, Fernando Gil, “Herculano tradutor e intérprete do Romantismo europeu”, in Revisitando Herculano no bicentenário do seu nascimento, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2013. Acessível em https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/12594.pdf.
[5] SANTOS, Mariana A. Machado, Alexandre Herculano e a Biblioteca da Ajuda, Separata de O Instituto, Vol. CXXVII, Coimbra, 1965, doc. reproduzido p.42.
[6] VASCONCELOS, Carolina Michaelis, Cancioneiro da Ajuda. - Lisboa : Impr. Nac. - Casa da Moeda, 1990. Início da Adverténcia Preliminar que abre o primeiro volume. BA. Usuais
[7] HERCULANO, A., Portugaliae Monumenta Historica, Lisboa, 1856, BA 135-III-31 a 35.
[8] Livro das Linhagens de D. Pedro, Conde de Barcelos, BA. Cod. 47-XIII-11.
[9] HERCULANO, A., Lendas e Narrativas, Emp. Diário de Notícias, Lisboa, 1920, Tomo II, p. 7. BA 141-II-1 e 2.
[10] HERCULANO, A., Da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Imprensa Nacional, Lisboa,1854, BA 52- VI-33 a 35.
[11] BA Cod. 50-V-33.
[12] HERCULANO, A., Annaes de D. João III por Fr. Luiz de Sousa, Lisboa, 1844, BA 52-VII-15
[13] SARAIVA, José António, Herculano Desconhecido, Publicações Europa-América, 2ª edição, 1971, p. 47.
[14] HERCULANO, A., “Monumentos Patrios”, Opusculos, Tomo II, Lisboa, 1907, p. 10. BA 119/120-B-83
[15] HERCULANO, A., “Apontamentos para a Historia dos Bens da Coroa e dos Foraes”,Opusculos, Tomo III, Lisboa 1897, p. 281. BA 119/120-B- 90.
[16] MONTEIRO, Ofélia Paiva, “Herculano :Da arte narrativa do ficcionista”, in Revisitando Herculano no bicentenário do seu nascimento, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2013, p. 10. Acessível em https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/12594.pdf.
[17] Herculano, A., O Bobo, Livraria Bertrand, s/data, p. 10. BA 135/136-J-85.
[18] HERCULANO, A., Portugaliae Monumenta Historica, vol. I, Lisboa, 1856, BA 135-III-31