Natal: Uma Alegoria à Maternidade

Oficio de la Virgen Maria                

                              

               

           Oficio de la Virgen Maria.... - Madrid: en la imprenta da Compañia, 1797. BA. 53-VI-1

A Biblioteca da Ajuda, herdeira da Real Biblioteca Particular, possui, no seu muito rico e diversificado acervo, um conjunto de obras com superlibros, marcas relevantes de anteriores proprietários, ou de ligação a encomendadores, ou patrocinadores das edições e que sinalizam as aquisições, doações, ou incorporações que ocorreram ao longo da sua história.

O exemplo que hoje apresentamos - Oficio de la Virgen Maria, livro de Horas, impresso em Madrid, em 1797, concentra toda a riqueza formal na encadernação cuidada, a marroquim vermelho gravado a seco e com ferros a ouro, enquadrando superlibros, com as iniciais "R" e "C" encimadas por coroa fechada, gravadas a ouro, uma na pasta anterior e outra na posterior, simbólica heráldica que nos remete para Carlos IV (1748-1819), rei de Espanha. Nada sabemos quanto à forma como a obra foi incorporada nas colecções da Biblioteca Real. No entanto, dadas as relações familiares próximas entre as duas casas reinantes, a de Espanha e a de Portugal, é provável que se tenha tratado de uma oferta do monarca espanhol a seus parentes da corte régia portuguesa. Quer a D. Maria I (1734-1816), sua prima direita, ou a sua filha D. Carlota Joaquina (1775-1830), à data da impressão do livro, Princesa do Brasil. 

Pastas, anterior e posterior, com as iniciais "R" e "C" encimadas por coroa fechada dentro de molduras com motivos vegetalistas, enquadradas por cercaduras com elementos florais, cantos, contra cantos e cortes dourados, num tipo de estilização  comum nas encadernações espanholas:

No Oficio, a entrada de cada episódio da Vida de Maria e de seu filho Jesus, é ilustrada com gravuras de autoria diversa, entre outros de Mariano Salvador Maella (1739 - Madrid 1819), pintor de Câmara do Rei Carlos IV, gravadas por Manuel Salvador Carmona, e ainda de autores, de menor relevo. De entre as imagens criteriosamente colocadas, introduzindo cada oração, destacamos a alusiva à Natividade que reflete a aprendizagem de Maella no ambiente artístico romano, prévia à sua nomeação como pintor da corte régia de Espanha.

A imagem de Jesus Menino, nas palhinhas, debaixo do olhar enlevado de sua Mãe, e da presença protectora de S. José, rodeado de pastores, e de animais domésticos, encimada por anjos celestiais que iluminam a cena, de invenção de Maella, replica a tradição milenar, de colocar Jesus entre os mais humildes, iconografia que prossegue com várias declinações ao longo dos séculos e que Maella reproduz a partir dos autores do barroco italiano, nas obras dos quais o artista se deixara influenciar. Imagens que são o reflexo do seu périplo de aprendizagem romano e da sua presença activa junto de Anton Raphael Mengs (1728-1779), pintor-académico que Carlos III (1716-1788) chamara para a Corte de Madrid, aí divulgando o gosto pela estética classicista romana.

Este livro do acervo da BA, para além de testemunho dos laços familiares, artísticos e estéticos que uniam as duas monarquias ibéricas e que se reflecte nas obras de arte que possuíam e nas que ofereciam com o objectivo de reforçar alianças políticas e afectivas, algumas das quais enriquecem as colecções patrimoniais nacionais, é ainda a expressão da matriz ideológica e imagética partilhada pelo Sul Católico. 

MMB@BA

Sem comentários: