HERBERTO HÉLDER (Funchal, 23 Novembro 1930 – Cascais, 24 Março 2015)



Considerado um dos mais importantes nomes da literatura portuguesa contemporânea - para muitos  o mais importante nome - Herberto Hélder, foi poeta, “o poeta dos poetas”, (mas assumindo-se sobretudo como autor: «sou o Autor, diz o Autor», que celebra o acto enunciativo como gesto criador), e tradutor, tendo reescrito para português poesia ameríndia e de povos africanos. Foi editor, repórter e redactor.

Viajante (fugitivo?) na juventude, itinerou pela Europa (do Norte), viveu clandestino, exerceu as mais diversas profissões, regressou. Ao longo da vida, soube, como ninguém, conquistar e merecer o seu direito à privacidade e tranquilidade, recusando qualquer manifestação de vaidade e glória públicas. Quis o silêncio da palavra escrita.

Herberto Hélder deixa-nos uma obra de génio, incomparável, que atravessa, fazendo confluir, géneros literários; a palavra atinge dimensões anteriormente por explorar, desconhecidas, únicas.

A sua obra poética encontra-se, desde 1973, reunida nas sucessivas edições de Poesia Toda, definindo o autor a sua obra: “o poema é um objecto carregado de poderes magníficos, terríveis: [...] promove uma desordem e uma ordem que situam o mundo num ponto extremo: o mundo acaba e começa»,

Está traduzido e publicado em vários países, dos quais se destacam Itália, Grã-Bretanha, Espanha, França.

Esta biblioteca homenageia o Poeta, transcrevendo um dos seus poemas.
Sentimos o privilégio de ter Herberto Hélder nas nossas vidas.

Sobre um Poema

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.

Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.

E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.

- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

Herberto Helder

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Bibliografia
Poemacto, 1961
Lugar, 1962
Os passos em volta, 1963;2006
Ofício cantante: 1953-1963 (antologia), 1967
Poesia toda, 1973 ; 1996
Cobra, 1977
Photomaton & Vox, 1979 ; 2006
Flash, 1980
Os selos, 1990
Do mundo, 1994
Ouolof , 1997
Servidões, 2013


AVISO


Informamos que, devido à realização de um evento oficial nesta Biblioteca, a leitura estará encerrada a partir das 15h30 de dia 17 de Março (terça-feira) até ao final do dia 18 de Março.
O horário regular será retomado no dia seguinte, 19 de Março 2015.
Agradecendo a compreensão dos leitores,

A Coordenadora da Biblioteca da Ajuda

Les Contes de Perrault

Compositions de Gustave Doré
Editions Hetzel



BA. 125-II-14




Sobre o conteúdo da obra em título há uma diversidade de abordagens (já feitas e a fazer) e um sem número de comentários, emanando da interpretação literária à psicológica, da artística à sociológica, pelo que nos cingiremos, por imperativos   
de
objectividade, ao livro - objecto físico – como confluência feliz e grandiosa de texto e imagem.

O texto – isto é: um conjunto de textos - de Charles Perrault (1628-1703), é composto por contos de fadas (designação assim fixada, variação do conto maravilhoso, mescla de conto popular e de fábula, de ambos recebendo lastro), escritos para crianças e jovens, mas cativando leitores de todas as idades, pelo fascínio que suscitam, por se constituírem em manifestação de representações dos sonhos mais profundos e, tantas vezes, inconfessáveis. Personagens mágicos, que nos transportam através de histórias encantatórias, dão vida a estes contos, atravessados inusitadamente por situação de conflito, que ultrapassam por acções transcendentes, sobrenaturais, que determinam sempre um final feliz: a vitória do bem sobre o mal.

“Era uma vez…” situa o cenário num tempo (passado, indefinido mas “visível”pela imaginação), em que personagens do onírico, com a verosimilhança que o nosso desejo de identificação permite, se movimentam numa acção que, parecendo prosaica, transcende o real e que, por isso, idealiza e glorifica o desfecho.

“La belle au bois dormant” (A Bela Adormecida) e “ Le petit chaperon rouge” (O Capuchinho Vermelho) são, porventura, os mais conhecidos de um mais vasto número de contos que povoam o imaginário de várias gerações de leitores e ouvintes.




Gustave Doré (1832 – 1883) ilustra, interpretando, os contos de Perrault, com mestria acima de qualquer dúvida, desocultando a aparente inocência dos textos ao acentuar traços de medo e de desejo, de ingenuidade e de perversidade, de candura e de perfídia, isto é: enfatizando os múltiplos (e paradoxais) sentidos dos textos.
 
A primeira edição desta magnifica obra – a ilustrada por Doré – data de 1862, publicada por J. Hetzel, em Paris.

Esta biblioteca possui um exemplar datado de 1864 (BA 125-II-14), apresentando uma bela encadernação em pele de cor vermelha, decorada com profuso gofrado dourado, intocada pelo tempo, à imagem da perenidade da obra. 

Um livro de referência e uma obra de arte! 

Ver: Exposição no Musée d' Orsay, Gustave Doré (1832-1883). El imaginario al poder